Não existe vida em Marte

quinta-feira, 23 de maio de 2019


Assim começou a sessão de perguntas do primeiro dia do festival Pint of Science no Mestre Cervejeiro do Flamengo, Rio de Janeiro. 

E a pergunta veio com uma explosão de fofura porque foi feita por Nina, uma garotinha esperta de 6 anos. Aliás, desculpe, ela mesma disse que não era uma pergunta e sim um comentário. 

Pint of Science é um festival de divulgação científica dentro de bares, aproximando a ciência do cotidiano, cientistas da sociedade que os financiam. Especialmente este ano, este tipo de festival é fundamental para apresentar às pessoas nossa balbúrdia diária, nossa contribuição para ciência e para a melhora de tecnologia, qualidade de vida e bem estar de uma comunidade.

No Mestre Cervejeiro do Flamengo, bar no qual fui coordenadora, tivemos mesas sobre a vida fora da Terra, reciclagem de eletroeletrônicos e a vida sem mosquitos. E posso falar? Os cientistas e a plateia deram um show! Foram três dias úteis, que as pessoas saíram de seus trabalhos, enfrentaram trânsito e lotaram o bar para conversar sobre ciência. Foi lindo, aprendemos muito, tanto cientistas quanto público, a construirmos uma ponte que nos aproxima e promove o diálogo entre nós.

E lembra da Nina? Ela também encerrou as perguntas do primeiro dia. Depois de seu comentário ela quis saber POR QUE não tem vida em Marte? E foi respondida, muito carinhosamente, pelo astrônomo da mesa que explicou com todo o cuidado garantindo que ela entenderia tudo.

E com a pureza e curiosidade legítimas de Nina, do alto de seus seis anos, termino minhas reflexões sobre o evento. Que nos sintamos livres para tecer nossos comentários exercendo o mais puro opinare aude*,  que tenhamos a curiosidade de perguntar a quem sabe mais que nós e possamos comunicar para todo e qualquer público nossas pesquisas com o carinho e dedicação que ficaram tão claros durante o festival.

Obrigada Pint of Science, nos  vemos em 2020. 










*"Opinare aude, deveria ser nosso slogan: pensar fora dos muros dos paradigmas estabelecidos, ousar, formar nosso juízo sobre os problemas tratados pelos cientistas e técnicos. Porque devemos pensar por nós mesmos, e não deixar que os técnicos pensem por nós. Trata-se de concebermos a opinião, não como uma fatalidade, ligada à impossibilidade de possuir a ciência, mas como uma escolha voluntária. Neste sentido, como término de um processo de reflexão sobre a ciência, a tecnologia e seu lugar na sociedade, a opinião pode ser o ato inaugural de uma ciência realmente democrática. Ter a coragem de emitir nossas opiniões significa ter a coragem de pensarmos por nós mesmos e formarmos nosso próprio juízo sem termos pleno conhecimento de causa." Fonte 

Resistiremos

quinta-feira, 9 de maio de 2019
Ignite Girls Camp - Av. Paulista - maio/2019


Converse com uma cientista - Museu do Amanhã - março/2019 (foto: Guilherme Leporace e Felipe Varanda)

Defesa de doutorado - IRD - março/2019

Converse com uma cientista - Museu do Amanhã - março/2019

Converse com uma cientista - FioCruz - carnaval/2019

Não vou postar uma foto séria, ou triste. Escolhi uma foto onde estou bem feliz, fazendo o que mais gosto. Ser cientista não é apenas um papel social que assumo, mas parte integrante da minha identidade, como eu performo nessa comunidade onde estou inserida. Sou muito comprometida com isso, com o impacto do meu trabalho no meu entorno e olha: não sou a exceção. Todos e todas as cientistas que conheço são absolutamente comprometidas com suas ciências, seus trabalhos e com a comunidade que atendem.
Literalmente tiramos leite de pedra, diminuímos contato com nossas famílias, investimos nosso dinheiro para comprar itens de laboratório, reagentes, papel, tinta para impressora. Tentamos construir um legado (muitas vezes as custas de nossa saúde mental) para fazer o possível e impossível para tocar nossas pesquisas. O que fazemos é importante para o país! Não desistiremos. Não será um corte que vai definir quem somos, no que trabalhamos. Resistiremos.
O que fazemos é importante! Impactamos famílias, melhoramos qualidade de vida do entorno de nossos centros (as vezes o alcance é ainda maior), salvamos vidas, criamos cultura, arte, trazemos soluções sustentáveis para nossos bairros, para cidades, países...para o planeta.
O que fazemos é importante! Estudamos saúde, política, as relações entre os indivíduos. Geramos renda com nossas descobertas, trazemos conforto com nossas técnicas psicoterápicas, criamos tecnologia para facilitar a vida das pessoas.
O que fazemos é importante! Resistiremos! Não estou de luto, estou em luta!

Deixo aqui a tradução de partes de um poema de Maya Angelou – Still I Rise (Tradução de Francesca Angiolillo)

Ainda Assim Eu Me Levanto

Você pode me inscrever na História
Com as mentiras amargas que contar,
Você pode me arrastar no pó
Mas ainda assim, como o pó, eu vou me levantar.

Minha elegância o perturba?
Por que você afunda no pesar?
Porque eu ando como se eu tivesse poços de petróleo
Jorrando em minha sala de estar.

Assim como lua e o sol,
Com a certeza das ondas do mar
Como se ergue a esperança
Ainda assim, vou me levantar

Você queria me ver abatida?
Cabeça baixa, olhar caído?
Ombros curvados com lágrimas
Com a alma a gritar enfraquecida?

Minha altivez o ofende?
Não leve isso tão a mal,
Porque eu rio como se eu tivesse
Minas de ouro no meu quintal.

Você pode me fuzilar com suas palavras,
E me cortar com o seu olhar
Você pode me matar com o seu ódio,
Mas assim, como o ar, eu vou me levantar

(...)

Das choças dessa História escandalosa
Eu me levanto
Acima de um passado que está enraizado na dor
Eu me levanto
Eu sou um oceano negro, vasto e irriquieto,
Indo e vindo contra as marés, eu me levanto.
Deixando para trás noites de terror e medo
Eu me levanto
Em uma madrugada que é maravilhosamente clara
Eu me levanto
Trazendo os dons que meus ancestrais deram,
Eu sou o sonho e as esperanças dos escravos.
Eu me levanto
Eu me levanto
Eu me levanto!


Ignite Girl Camp 2019

segunda-feira, 6 de maio de 2019


O conhecimento é o mais potente dos afetos. Nietzsche e Spinoza, apesar de extemporâneos, faziam afirmações semelhantes a essa. Não é a toa que os caras eram gênios, vamos combinar?
Neste último final de semana, aconteceu o Ignite Girls Camp; um workshop de divulgação científica para mulheres que culminou com uma mostra de ciências em plena Paulista no domingo. Sentei aqui para compartilhar minhas experiências com vocês e nem sei se conseguirei. Sabe quando você desce em uma montanha russa e o deslocamento de ar (misturado com a excitação do momento) é tão grande que ficamos sem respirar por alguns momentos? Estou assim.

É impressionante o poder da rede; a potência de um grupo de mulheres altamente capacitadas, competentes e comprometidas com seus saberes e seus afetos é inimaginável. Vocês acreditam que fizemos uma mostra de divulgação científica absolutamento do zero em 3 dias? No início do evento não sabíamos nada do que aconteceria, não tínhamos um tema pré-definido...nada. Todo planejamento, execução, compra de materiais, aluguel de serviços, montagem de experimentos....tudo, foi feito em 3 dias. E, sério, isso é muito potente!

Abusando um pouquinho de Spinoza, ele acreditava que o desejo que nasce da alegria é mais forte que o desejo que nasce da tristeza, porque o primeiro aumenta a nossa capacidade de conhecer e agir. É nessa hora que alguém mais desavisado poderia se perguntar: ‘ora, porque um treinamento só para mulheres cientistas?’ Pois bem, a cada etapa que uma mulher cientista avança na sua carreira, menos ela tem a chance de encontrar outras mulheres. Isso implica que a ciência é feita, divulgada, fomentada por homens. Não são raros (e há dados que comprovam isso) relatos de assédio moral e sexual, favorecimento de colegas homens no momento de escolha de projetos, fomentos etc. Então encontrar um ambiente seguro para criar e compartilhar suas ideias, sem ter que esbarrar em todos os viéses que nos atravessam diariamente, é um presente.

Então voltando à fala do Spinoza, em um ambiente alegre e acolhedor fomos super heroínas, criamos um produto sensacional em pouquíssimo tempo. E com afeto, alegria, muito estudo, muita escuta e acolhida, muita técnica e profissionalismo. Com isso tudo, só tenho a agradecer a Ignite pela oportunidade e aproveito a convidar a todas que participem dos próximos camps pois eles são sensacionais.



Feito com ♥ por Lariz Santana